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Taxed Enough Already.

Sexta-feira, 29.10.10

Conforme seria de esperar, depois das inevitáveis pressões externas, lá recomeçou o tango das negociações em torno do Orçamento de Estado. A ninguém interessa que o Orçamento seja péssimo e que esta equipa das Finanças não tenha já a mínima credibilidade para assegurar sequer a sua execução. Mas como irresponsavelmente se proibiu na Constituição o Presidente de dissolver a Assembleia nos últimos seis meses do seu mandato, é impossível neste momento refrescar a legitimidade política do Parlamento e do Governo. Daí que a tentação de deixar tudo no mesmo seja muito grande.

 

Devo dizer que fazer negociações com o Governo nesta altura me parece errado, porque tem por efeito co-responsabilizar o PSD por este orçamento. Estas negociações acabaram afinal por revelar que a diferença entre o PS e o PSD se resume a uns trocos nas deduções fiscais ou no IVA do leite com chocolate. Como é que o PSD, depois do discurso no Pontal em que proclamou não aceitar aumentos de impostos, pode afinal depois limitar a sua divergência a questões menores? Este Orçamento vai ter uma redução drástica dos salários dos funcionários públicos, o estabelecimento de um tecto máximo para as deduções com despesas de saúde, o aumento brutal das taxas do IRS e o do IVA, e o congelamento das reformas, mas estas medidas não merecem uma única crítica do principal partido da oposição, parecendo considerar-se normal que o Estado trate assim os seus cidadãos.

 

Nesta proposta de Orçamento, o Estado não demonstra qualquer controlo na sua despesa, insistindo em obras faraónicas, parcerias público-privadas, institutos públicos inúteis (salvo os já extintos) e outros gastos desnecessários. Ao contrário do que tem sido dito, toda a consolidação orçamental se está a fazer essencialmente por via da receita, e especialmente a partir do aumento do IVA, o que terá consequências económicas drásticas. Já as propugnadas reduções de despesa são meramente aparentes. A redução de salários é absolutamente equivalente a um  imposto sobre os rendimentos de trabalho dos funcionários públicos. A redução da despesa fiscal não passa de uma eliminação da personalização do IRS, fazendo os doentes pagar imposto mesmo quando não têm rendimento disponível. E por aí adiante.

 

Não deveria, pelo contrário, o Estado reduzir a sua dimensão em ordem a evitar este brutal aumento de encargos aos cidadãos? Estaremos condenados a viver num país em défice permanente, que necessita para sobreviver de se endividar no exterior, cada vez a juros mais altos? Há quantos anos é que Portugal não tem um orçamento equilibrado? É bom que as pessoas percebam que, a continuarmos assim, iremos de PEC em PEC numa espiral de endividamento e tributação, uma vez que a dívida de hoje são os impostos de amanhã.

 

Mas, para além do inevitável acordo com o PSD, choca-me a passividade do Presidente da República, que aliás tinha em tempos idos escrito um artigo a qualificar este Estado despesista como "o Monstro". Se bem me lembro, Cavaco fez neste mandato três comunicações ao país, uma sobre o Estatuto dos Açores, outra sobre a segurança informática dos seus computadores, e uma última sobre o casamento homossexual. Mas perante as evidentes dúvidas de constitucionalidade das medidas do PEC 2, que aumentou retroactivamente as taxas do IRS, preferiu solicitar apenas uma fiscalização sucessiva do diploma, colocando a questão no limbo. É provavelmente o que irá acontecer também com as evidentes suspeitas de inconstitucionalidade do Orçamento para 2011, pelo menos no que respeita à redução de salários. E aí pode perguntar-se por que há-de estar empenhado o Parlamento numa revisão constitucional, quando pelo menos em matéria fiscal a Constituição é completamente esquecida.

 

Devo dizer, por isso, que compreendo perfeitamente o sucesso da mensagem simples do Tea Party americano: Cumpra-se a Constituição, reduza-se o peso do Estado e alivie-se a carga fiscal dos contribuintes, que já são suficientemente tributados. Taxed enough already! Da minha parte também estou disposto a renunciar a isto tudo. Não vejo é que o Orçamento do Estado para 2011 aponte nesse sentido.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 18:28

O beco sem saída do PSD.

Sexta-feira, 15.10.10

A estratégia política do PSD nos últimos tempos tem revelado um enorme desnorte e conduziu o partido a uma situação que não tem paralelo na sua história recente. Deixe ou não deixe passar o Orçamento, neste momento o PSD perde sempre aos olhos dos portugueses, e comprometeu seriamente as suas hipóteses de chegar ao poder nos tempos mais próximos.

 

Conforme aqui escrevi em Maio passado, o maior erro que o PSD cometeu nos últimos tempos foi a viabilização do PEC II. Nessa altura, já era evidente o descontrolo das contas públicas, pelo que havia toda a justificação para derrubar o Governo e solicitar novas eleições, que o Presidente ainda poderia convocar. Passos Coelho tinha na altura sondagens altamente favoráveis, pelo que tinha todas as condições para fazer uma campanha eleitoral responsabilizando o Governo pela situação a que tinha deixado chegar o país. Não seria nada diferente do que fez Cavaco Silva em 1985, quando não hesitou em derrubar o Governo, mal assumiu a liderança do PSD. Em política, assumir riscos compensa. Audaces fortuna juvat. Se Passos Coelho o tivesse feito, seria hoje Primeiro-Ministro.

 

Passos Coelho preferiu, no entanto, optar pelo calculismo político e, apesar de um ridículo pedido de desculpas, aceitou dar a mão ao Governo, avalizando a sua política. Ora, ser transformado em muleta de um Governo é a pior coisa que pode acontecer a um partido da oposição. Será sempre responsabilizado depois pelo fracasso desse Governo, sem que venha a beneficiar minimamente se ele tiver sucesso. Pelo meio, o PSD resolveu entrar num debate esotérico sobre a revisão constitucional, que só serviu para dar uma imagem de distanciamento das preocupações reais do país, permitindo ao Governo escapar mais uma vez à sua responsabilidade pelo descontrolo das contas públicas.

 

Começando a perceber a armadilha em que tinha caído, Passos Coelho ensaiou então uma fuga para a frente no discurso do Pontal, pondo condições mínimas para viabilizar o orçamento, no intuito de começar a distanciar-se do Governo e livrar-se do qualificativo de "parceiro de tango", como lhe chamou Sócrates. O Governo, no entanto, percebeu a estratégia e não só não aceitou as suas condições, como prometeu que se demitiria se o orçamento fosse rejeitado. Teve, no entanto, a esperteza de esperar pela altura em que a Assembleia já não podia ser dissolvida e de fazer essa ameaça em Nova Iorque, o que naturalmente agravou ainda mais a imagem externa do país perante os credores. Como era evidente que a situação económica se agravaria consideravelmente com um Governo demitido em gestão durante oito meses, passou a ser Passos Coelho a ficar com o ónus de não deixar agravar ainda mais a situação do país.

 

Tendo sido manifestamente encurralado numa situação que não desejava, Passos Coelho deveria ter saído dela imediatamente, declarando se viabilizava ou não o orçamento. Foi, aliás, o que fizeram os outros partidos da oposição. Hesitou, no entanto, proferindo declarações contraditórias, e dando uma imagem de indecisão, que é fatal para um líder político. Em consequência, assistimos depois a uma patética série de apelos de notáveis, nacionais e estrangeiros, ao "sentido de responsabilidade" de Passos Coelho. Aí se incluiu um encontro com banqueiros na sede do PSD, o que constitui um erro político gravíssimo, pois transmite ao exterior a imagem de que o PSD é influenciável pelo poder económico.

 

Em resultado disto, faça o que fizer o PSD na votação do orçamento, será sempre o grande perdedor dessa votação. Se deixar passar o orçamento, será acusado de ter cedido aos apelos da plutocracia e de ser insensível perante as medidas altamente gravosas para os cidadãos que o orçamento contém, algumas das quais mesmo inconstitucionais. Se rejeitar o orçamento, será acusado de ter causado a bancarrota do país. Estamos como naquele célebre adágio brasileiro: "se fugir o bicho pega, se ficar o bicho come". Eu só me pergunto é como foi possível termos sido arrastados para esta situação.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 16:57





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