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A responsabilidade política pelo caos nas eleições

Quinta-feira, 27.01.11

Domingo passado calhou-me ser um dos afectados pela extraordinária confusão causada no recenseamento eleitoral. Deslocando-me juntamente com a minha mulher para votar na mesma secção onde voto há 16 anos, verifiquei que, apesar de os nossos números de eleitor serem seguidos, enquanto que ela conseguiu votar, o meu nome tinha sido apagado dos cadernos eleitorais. Lá tive que enfrentar uma enorme fila para saber o novo número e qual é o meu espanto quando me dizem que, em virtude de ter tirado o cartão de cidadão, o meu local de voto tinha sido transferido para outra escola a quilómetros de distância, cuja morada exacta ninguém sabia! Não deixei de perguntar perplexo que sentido fazia duas pessoas com a mesma residência votarem em lugares a quilómetros de distância um do outro. A resposta que me deram foi que, quando a minha mulher tirasse o cartão de cidadão, provavelmente também a mudariam para essa nova escola. Lá tive de andar em busca dessa misteriosa escola, onde encontrei alguns conhecidos, igualmente perplexos com a situação.

 

O problema, no entanto, é que, se isto me aconteceu no centro de Lisboa, imagino o que se terá passado no interior do país. Ora, suprimir o nome de um eleitor de um caderno eleitoral, sem sequer o notificar, é um acto muito grave. Fazê-lo a centenas de milhares de eleitores assume uma gravidade extrema. Pouco falta para termos que chamar a OSCE para averiguar se as nossas eleições decorrem em condições de regularidade e transparência.

 

Mas, perante esta enorme confusão, que faz o Ministro da Administração Interna? Primeiro pediu desculpa aos eleitores, como se as relações de um governante com os eleitores fossem relações pessoais e não assuntos de Estado. Depois anunciou um pedido de inquérito à Universidade do Minho, quando toda a gente já sabe o que se passou, sendo assim esse inquérito um gasto inútil de dinheiros públicos, numa altura em que o país vive em constrangimento orçamental permanente. Finalmente, é anunciada a demissão de dois directores-gerais do Ministério. Mas o cartão do cidadão não era um projecto emblemático do Governo? E a responsabilidade pela forma como foi lançado não é do Governo e principalmente do Ministro da Administração Interna? Temos agora que, depois de reduzir os salários aos funcionários públicos, o Governo pretende ainda transformá-los em bodes expiatórios das suas iniciativas.

 

A evidente responsabilidade política do Ministro neste caso deveria levá-lo a apresentar a sua demissão imediata. Já sabemos, no entanto, que neste âmbito a culpa morre sempre solteira.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 13:58

As prendas aos titulares de cargos públicos.

Quarta-feira, 26.01.11

 

 

 

Esta notícia agrava ainda mais o cada vez maior distanciamento dos cidadãos em relação aos políticos. Temos então que um antigo Presidente da República, que ocupou o cargo simbolicamente mais importante do Estado, se gaba de durante o seu mandato ter recebido "prendas de Natal" que "não cabiam em três salas". E acrescenta que "nunca comprei uma caneta ou um relógio mas nunca me senti minorado na minha honestidade por causa disso". E exemplifica dizendo: "Esta caneta que uso foi-me oferecida. Mas não sei dizer quem ma deu". Terá Jorge Sampaio consciência do efeito público que estas suas declarações provocam? É manifesto que o recebimento de prendas não diminui a honestidade de ninguém e sabemos todos que o Presidente Sampaio nunca alteraria as suas decisões em função das prendas que recebeu. Não é isso o que está em causa. O que está em causa é a imagem pública que este tipo de notícias produz nos cidadãos em relação à actividade política, e pela qual um Presidente da República deve ser o primeiro a zelar. O que eu gostaria de ter ouvido um antigo Presidente da República dizer era: "Posso ter ofendido imensa gente durante o meu mandato, mas garanto que todas as prendas que me enviaram foram devolvidas pelos serviços da Presidência. E só uso canetas compradas por mim ou oferecidas pelos meus familiares e amigos". E acho que é isto o que os cidadãos têm o direito de esperar do mais alto magistrado da Nação.

 

 

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publicado por Luís Menezes Leitão às 16:44

A inconstitucionalidade do orçamento para 2011 (na Renânia do Norte-Vestefália).

Quarta-feira, 19.01.11

 

 

 

Conforme se pode verificar nesta notícia o Tribunal Constitucional da Renânia do Norte-Vestefália, um Estado federado alemão, acaba de suspender, em virtude de uma providência cautelar instaurada pela oposição de direita, o Orçamento daquele Estado para 2011 por o considerar inconstitucional, dado que viola os critérios de limitação da dívida pública. A consequência deste facto é que o Governo da coligação verde-vermelha (SPD- Die Grünen) que governa o Estado fica sem possibilidade de se endividar, sendo evidente o impacto que tal terá na sua governação. Já se fala por isso até na possibilidade de novas eleições. Mas o que é verdadeiramente significativo é que este Tribunal Constitucional impôs o respeito pela constituição do seu Estado, não pactuando com a sua violação por parte do Governo, independentemente das consequências políticas e financeiras que daí pudessem advir. Este é um bom exemplo para Portugal, igualmente confrontado com um Orçamento de Estado para 2011 grosseiramente inconstitucional, mas onde se pretende fazer prevalecer as exigências de financiamento do Estado sobre os direitos fundamentais constitucionalmente consagrados. Na verdade, o que faz a força da Alemanha não é apenas a enorme capacidade de trabalho dos seus cidadãos. É também a forma intransigente como os seus tribunais aplicam as suas leis.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 12:13

Os apelos do PS ao PSD.

Quinta-feira, 13.01.11

Confesso que já ando há bastante tempo farto desta entente cordiale entre o PS e o PSD, que se traduziu na viabilização dos inúmeros PEC, sendo que o último representa mesmo "o inverno do nosso descontentamento". Parece, no entanto, que no PS acham que ainda não chega e Jorge Lacão permite-se mesmo apelar publicamente a Passos Coelho para que mais uma vez dê a mão ao Governo, desta vez na sua cruzada constante contra os magistrados judiciais. Por mim, acho que é altura de o PSD dizer: "Basta!". Se o Governo quer continuar nas suas guerras privadas, incluindo contra os magistrados, ao menos que as trave sozinho. O PSD deve aspirar a muito mais do que ser o silent partner deste Governo

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publicado por Luís Menezes Leitão às 16:10

A Constituição e a crise financeira.

Quarta-feira, 12.01.11

<<Na minha opinião, a medida de redução de salários decretada no Orçamento para 2011 viola grosseiramente a Constituição. Não me espantam por isso as inúmeras acções e providências cautelares que têm surgido e irão continuar a surgir contra essa medida. O que me espanta são os argumentos que têm sido usados no espaço público contra a sua apreciação judicial, que parecem ignorar todas as regras jurídicas vigentes em Portugal>>.

 

Hoje no Diário de Notícias.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 19:00

Recordando Marcello Caetano.

Quarta-feira, 05.01.11

 

 

Fico perfeitamente siderado quando vejo constitucionalistas a dizer que não há qualquer problema constitucional em decretar uma redução de salários na função pública. Obviamente que o facto de muitos dos visados por essa medida ficarem insolventes e, como se viu na Roménia, até ocorrerem suicídios, é apenas um pormenor sem importância. De facto, nessa perspectiva a Constituição tudo permite. É perfeitamente constitucional confiscar sem indemnização os rendimentos das pessoas. É igualmente constitucional o Estado decretar unilateralmente a extinção das suas obrigações apenas em relação a alguns dos seus credores, escolhendo naturalmente os mais frágeis. E finalmente é constitucional que as necessidades financeiras do Estado sejam cobertas aumentando os encargos apenas sobre uma categoria de cidadãos. Tudo isto é de uma constitucionalidade cristalina. Resta acrescentar apenas que provavelmente se estará a falar, não da Constituição Portuguesa, mas da Constituição da Coreia do Norte.

 

É por isso que neste momento tenho vontade de recordar Marcello Caetano, não apenas o último Presidente do Conselho do Estado Novo, mas também o prestigiado fundador da escola de Direito Público de Lisboa.  No seu Manual de Direito Administrativo, II, 1980, p. 759, deixou escrito que uma redução de vencimentos “importaria para o funcionário uma degradação ou baixa de posto que só se concebe como grave sanção penal”. Bem pode assim a Constituição de 1976 proclamar no seu preâmbulo que "o Movimento das Forças Armadas […) derrubou o regime fascista". Na perspectiva de alguns constitucionalistas, acabou por consagrar um regime constitucional que permite livremente atentar contra os direitos das pessoas de uma forma que repugnaria até ao último Presidente do Estado Novo.

 

Diz o povo que "atrás de mim virá quem de mim bom fará". Se no sítio onde estiver, Marcello Caetano pudesse olhar para o estado a que deixaram chegar o regime constitucional que o substituiu, não deixaria de rir a bom rir com a situação.

 

 

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publicado por Luís Menezes Leitão às 13:15





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