Isto não vai acabar bem!
Quando o Primeiro-Ministro grego necessita de fazer apelos compungidos a um jornal alemão para que deixem o país respirar atingimos o grau zero da dignidade de um Estado. Tenho muitas dúvidas por quanto tempo é que os gregos vão continuar a aceitar isto. A cegueira dos actuais líderes europeus corre o risco de conduzir a Europa a uma catástrofe sem precedentes. Ninguem compreendeu as lições da História?
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O Bloco de Esquerda.
Os tempos de crise que atravessamos podem bem conduzir a uma alteração radical no sistema partidário português, como já se verificou na Grécia e na Itália. É interessante por isso analisar o estado dos diversos partidos portugueses. Comecemos naturalmente pelo Bloco de Esquerda, face ao anúncio da saída de Francisco Louçã da sua liderança.
Para se perceber bem o Bloco de Esquerda é necessário recuar muito tempo atrás, aos inúmeros partidos de extrema-esquerda surgidos após o 25 de Abril. Na altura tínhamos entre muitos outros a UDP, o MRPP, a LCI, o PRT, o PRP-BR, o PCP-ML, a AOC, o MES, o POUS, o PST, etc, etc. Estes partidos abrangiam todas as correntes comunistas possíveis e imaginárias, desde estalinistas, maoistas, trotskistas, albaneses e outros. Unia-nos, no entanto, um ponto comum que era um ódio profundo ao PCP, porventura até maior que o que tinham à direita. O PCP era designado por social-fascista e objecto de ataques sistemáticos. O PCP-ML pretendia assegurar pelo próprio nome que o PCP já não era marxista-leninista. E ficou célebre um slogan da AOC que dizia que cada deputado que elegesse era uma espinha na garganta de Cunhal.
Desses partidos o único que tinha peso eleitoral era a UDP que, devido à concentração dos seus votos em Lisboa, elegia sistematicamente um deputado, primeiro Acácio Barreiros e depois Mário Tomé. No parlamento a UDP prosseguia ataques sistemáticos ao PCP, que designava por "o partido dito comunista", suscitando imediatamente protestos do mesmo. A certa altura chegou a anunciar a criação de um partido comunista reconstruído, primeiro PCP(R) e depois PC(R).
A partir de 1978 surge, no entanto, o PSR, a partir de uma fusão da LCI com o PRT, com cariz trotskista. O PSR chama a atenção pela qualidade dos seus tempos de antena, que apresentavam ideias distintas da banalidade geral. Quando tenta uma frente eleitoral com a UDP os resultados são desastrosos, pelo que o partido continua a concorrer autonomamente, beneficiando do brilhantismo de Francisco Louçã que, no entanto, nunca era eleito.
Francisco Louçã tem um enorme defeito. É inegavelmente um dos mais bem preparados líderes partidários, com uma grande bagagem cultural e uma enorme capacidade dialéctica, forjada por muitos anos de debates desde a mais tenra juventude. Talvez por isso mesmo só o vi baquear uma única vez perante um líder da direita, num debate com Durão Barroso, que tem a vantagem de ter andado pelas mesmas lides. A sua inteligência torna-o, porém, frio e distante dos eleitores, pelo que não consegue ter grande sucesso eleitoral. Em 1991 esteve a um passo de ser eleito para o parlamento. Bastava para isso convencer 1/5 dos eleitores da aldeia de D. Maria, uma terreola nos arredores de Lisboa que boicotou as eleições por não ter água canalizada, a votar nele. Louçã bem se deslocou a D. Maria, prometendo a partir do Parlamento resolver o assunto. Os eleitores, porém, mantiveram o boicote, confirmando a eleição do último deputado do PSD, que naturalmente se esteve nas tintas para a água de D. Maria. Nas eleições presidenciais a que concorreu, Louçã pôde confirmar que o seu peso eleitoral é reduzido.
O sucesso eleitoral do Bloco deve-se, por isso, essencialmente a um homem: Miguel Portas, que era tão inteligente como Louçã mas muito mais caloroso com os eleitores. A partir de três pequenos partidos, já que juntou a Política XXI de dissidentes do PCP, às tradicionais UDP e PSR, conseguiu nas eleições europeias de 1999 apresentar um projecto eleitoral consistente, falhando por pouco a eleição para deputado europeu. A partir daí estava feito o mais difícil. Nas eleições legislativas que se seguiram o Bloco obteve dois deputados, levando Francisco Louçã e Luís Fazenda a conseguir os lugares de deputados que há tantos anos ambicionavam. E os dez anos seguintes foram de crescimento sucessivo para o Bloco que capitalizava com os descontentes da ala esquerda do PS sem, porém, entrar minimamente no eleitorado do PCP, que nunca esqueceu a inimizade desde sempre existente.
As eleições de 2011 mostraram, porém, que o voto útil à esquerda é mortal para o Bloco, que se viu reduzido a metade dos deputados em virtude da ameaça de uma vitória do centro-direita. Ficou assim demonstrada uma grande permeabilidade entre a ala esquerda do PS e o Bloco, a qual aliás teve tradução no Parlamento com os deputados do Bloco a aderir em peso à intenção manifestada pelos deputados da ala esquerda do PS de suscitar a inconstitucionalidade do corte dos subsídios. Como não podia deixar de ser, o PCP ficou de fora da iniciativa.
Louçã percebeu por isso que os seus eleitores e até os seus deputados não resistiriam a uma aproximação ao PS, pelo que preferiu sair, alegando a necessidade de renovação, ainda que contraditoriamente aponte como sucessor alguém ainda mais velho. Sugeriu até uma liderança bicéfala, talvez a única maneira de satisfazer as contradições existentes no Bloco, o que só servirá para acentuar as mesmas. O Bloco de Esquerda corre assim o risco de se evaporar nos próximos tempos. O exemplo do PRD leva a pensar que os partidos que tentam entrar no quadro partidário surgido no 25 de Abril podem ter sucesso a princípio, mas esse sucesso é efémero.
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Os apelos do Presidente.
Fico cada vez mais perplexo com os apelos de Cavaco Silva. Agora vem apelar ao BCE para começar desde já a comprar títulos da dívida portuguesa e irlandesa. Até pode ser que o apelo seja muito justificado, mas Cavaco Silva é o Chefe de Estado de Portugal e não pode colocar-se numa posição de inferioridade, a fazer pedidos públicos a um funcionário não eleito, como Mário Draghi. Pela minha parte, estava à espera de tudo, menos de ver o Presidente de Portugal a apelar à compra de títulos da dívida portuguesa. E ainda mais perplexo fico quando inclui no mesmo pacote a Irlanda, excluindo no entanto a Grécia. Estamos zangados com os gregos ou já os damos como um caso perdido? E da Irlanda, terá havido alguém que encomendou ao nosso Presidente esse sermão? Ou será Cavaco acha que Mr. Michael D. Higgins, actual Presidente da Irlanda, não está a vender adequadamente os títulos do seu país e quer desde já dar-lhe uma ajuda? Tudo isto me parece mau de mais para ser verdadeiro.
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Empreendedorismo.
Como é bom ser empresário em Portugal, especialmente na área das energias renováveis. Anunciamos um simples projecto para criar uma fábrica de painéis solares e logo o Estado nos auxilia, acarinhando o nosso projecto. Precisa de dinheiro? Não se preocupe. O Estado disponibiliza-lhe desde já 128 milhões de euros no âmbito do QREN. Faz-lhe falta um terreno para instalar a sua fábrica? Não se preocupe. A Câmara Municipal compra já o terreno por um milhão de euros e a seguir vende-lho a si por uns módicos 100.000 €. E ainda há gente que acusa Portugal de não estimular o empreendorismo. Que enorme falsidade! Em Portugal os poderes públicos estão sempre disponíveis para ajudar os empresários empreendedores. Uma perguntinha apenas: não deveriam os mesmos sujeitar-se às regras de mercado como todos os outros e suportar do seu bolso os investimentos necessários? Não é isso o que acontece por esse mundo fora?
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A desunião europeia.
Cada vez se torna mais evidente que os diversos países do euro vão sucessivamente cair como peças de dominó, arrastando a União Europeia para o colapso. A razão principal para isto é que todas as instituições comunitárias praticamente se apagaram, desde o início da crise enquanto a Alemanha põe e dispõe. Durão Barroso há muito que se fechou no seu gabinete em Bruxelas, raramente fazendo uma declaração, a não ser para alinhar com as posições alemãs. E Mário Draghi, que há dias dizia que iria "fazer tudo" para salvar o euro, acaba de se vergar também ao Diktat alemão, exigindo um pedido de resgate de Espanha e Itália apenas para comprar dívida destes dois países.
Com esta deriva na Europa o colapso do euro é inevitável. Mas está à vista o que se vai passar depois: um sucessivo apontar de culpas entre os diversos países com exigências de responsabilização mútuas. Na Grécia há muito que se fala em exigir as indemnizações de guerra que a Alemanha nunca lhe pagou. Agora na Polónia houve um deputado que se lembrou de exigir o pagamento de um empréstimo feito à Espanha há 400 anos que nunca foi liquidado. Se começamos a entrar neste tipo de contabilidades na Europa, ninguém sabe onde isto vai acabar. Pode ser que Portugal também se lembre de exigir a Espanha a indemnização pelos 60 anos de ocupação do país. Ou reclamar já a França todos os inúmeros danos causados pelas invasões napoleónicas. Se calhar no fim ainda ficávamos a ganhar.