E se criássemos mais uma comissão?
Este Governo começa a parecer-se cada vez mais com o grupo de conselheiros de Júlio César no Obélix et Compagnie. Temos um problema para resolver? Cria-se mais uma comissão para analisar esse problema, a qual depois se dividirá em sub-comissões específicas ou então combina-se um almoço para discutir o assunto. Sabe-se que para além de ter que alterar o orçamento de Estado em virtude do chumbo do Tribunal Constitucional, o Governo deveria explicar onde é que vai cortar 4.000 milhões de euros na despesa do Estado. Mas depois inúmeros conselhos de ministros, a discutir não se sabe o quê, em que inúmeros ministros decidiram pelejar uns com os outros, chega-se à conclusão que é melhor deixar o assunto para depois do 1º de Maio.
Mas, como não podia deixar de ser, Vítor Gaspar não perde a oportunidade de nomear mais comissões. Já tinha criado o Conselho de Finanças Públicas, que foi um excelente estímulo ao emprego no sector. Em seguida criou a ESAME-Estrutura de Acompanhamento dos Memorandos, com nada menos que 30 elementos, com emprego assegurado até 30 de Junho de 2014, sem prejuízo de prorrogação se o país vier a necessitar de novos resgates. Agora, como se isto não bastasse, surge mais uma Comissão de Normalização Contabilística e uma Unidade Técnica de Acompanhamento de Parcerias Público-Privadas, que acabam de tomar posse.
Alguém acredita que assim é possível reduzir a despesa pública? Eu não. Talvez por isso o que este Governo vai anunciar será seguramente a criação da CCDE - Comissão para Cortar na Despesa do Estado, com um orçamento de milhões e centenas de funcionários. E depois os Ministros lá poderão reunir com toda a tranquilidade.
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Um verdadeiro escândalo.
Já aqui me tinha pronunciado há vários meses sobre o verdadeiro escândalo que é o facto de gestores públicos andarem a apostar o dinheiro das empresas públicas em instrumentos financeiros especulativos. O que é motivo para se ficar perplexo é saber-se agora a dimensão do buraco criado — 3.000 milhões de euros. É mais do dobro do impacto que teve a decisão do Tribunal Constitucional. Parece-me por isso que o Primeiro-Ministro deveria fazer um acto de contrição em relação ao discurso que fez sobre o Tribunal Constitucional. Afinal de contas, o Tribunal Constitucional, ao deitar abaixo o Orçamento, conseguiu causar menos impacto ao Estado do que esta situação.
Este capitalismo de casino é o grande responsável pelo estado a que se deixou chegar a economia mundial. Quando alguém quer apostar na roleta, é melhor que o faça com o seu dinheiro. Apostar dinheiro público neste tipo de instrumentos parece-me absolutamente insustentável. Especialmente quando já se sabe que serão os do costume a pagar outra vez a factura.
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Descubra as diferenças.
Afonso Costa, Novembro de 1906:
Mário Soares, Abril de 2013:
"O Presidente Cavaco Silva devia lembrar-se da história do Séc. XX. Por muito menos que isto foi morto D. Carlos".
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Os dinossauros apelam ao Constitucional.
Conforme já me pronunciei várias vezes, parece-me claro que a Lei 46/2005, de 29 de Agosto, proibe claramente este expediente de os autarcas quererem saltitar de concelho em concelho. Esta é a posição que está a fazer vencimento na jurisprudência e, se dúvidas houvesse, encontra-se aqui uma argumentação muito convicente de que a proibição é relativa à função e não ao território.
É por isso que acho muito bem as providências cautelares para evitar este desrespeito grosseiro da lei, seja quem for que as interponha. E é óbvio que as providências cautelares podem ser instauradas antes de as candidaturas serem formalizadas, bastando que sejam anunciadas. O que justifica a providência cautelar é o justo receio de que alguém venha a provocar uma lesão dos direitos alheios, não se exigindo a consumação da lesão. Se um devedor anunciar que vai fugir com os seus bens, qualquer tribunal autoriza um credor a interpor um procedimento cautelar a pedir o arresto dos mesmos. Da mesma forma é legítimo interpor uma providência cautelar se um autarca anunciar que se vai candidatar ao concelho vizinho, em clara contrariedade à lei, sabendo-se da enorme perturbação do processo eleitoral que isso vai causar.
Não deixa de ser, porém, curioso os dinossauros autárquicos esperarem que o Tribunal Constitucional os salve, perante a interpretação da lei que está a ser feita pelos Tribunais comuns. Não excluo que isso aconteça. sabendo-se da facilidade com que o Tribunal Constitucional decide contra o entendimento geral. Pelo menos 80% dos constitucionalistas deste país disseram que a CES era inconstitucional, mas o Tribunal Constitucional não viu na mesma qualquer problema. Mas o Tribunal Constitucional cobrir-se-á de ridículo se vier a permitir esta fraude à lei, em contrariedade à posição dos outros tribunais. A meu ver, o regime já está suficientemente descredibilizado para que aconteça uma situação deste tipo.
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E vão dois.
Depois de Fernando Seara é agora Luís Filipe Menezes que é impedido pelos tribunais de se candidatar à Câmara do Porto. Não sei sinceramente o que passou pela cabeça dos estrategas autárquicos do PSD, ao insistir nesta estratégia de recandidatar dinossauros autárquicos em câmaras distintas. Isto dá para a opinião pública uma imagem desastrosa de total incapacidade de renovação do partido, quando havia tantos jovens quadros capazes de apresentar candidaturas com hipótese de vitória. Mas ao mesmo tempo dá uma imagem de hipocrisia e de inconsistência. Costuma dizer o povo que quem não quer ser lobo, não lhe veste a pele. Se o PSD queria candidatar os seus autarcas até à eternidade, nunca poderia ter aprovado uma lei de limitação de mandatos. Se a aprovou, é manifesto que depois não a poderia tornear, procurando deslocar os seus autarcas de concelho para concelho. Tal representa uma autêntica fraude à lei que muito provavelmente os tribunais não sancionariam. E em qualquer caso é uma estratégia politicamente suicida pôr os candidatos a combater os tribunais em lugar de combater os seus adversários. Só de facto quem se está a lixar para as eleições é que pode apresentar uma estratégia semelhante. Insistir nela é provocar o desastre.
P.S. Faço esta apreciação independentemente da avaliação do mérito dos candidatos. Na verdade, se não existisse este problema, Seara seria um bom candidato a Lisboa. Já Menezes, pelo contrário, parece-me ser um péssimo candidato ao Porto. Como já observei aqui, achei desastroso ele ter aparecido, depois de anos de gestão equilibrada de Rui Rio, a propagandear as virtudes do despesismo autárquico, prometendo fazer três novas pontes e um túnel no Porto. Se esta decisão judicial contribuir para que surja uma candidatura com propostas mais adequadas ao momento em que vivemos, estou seguro que os portuenses agradecerão.
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Margaret Thatcher 1925-2013.
Faleceu hoje uma das personalidades mais marcantes de todo o séc. XX. Margaret Thatcher foi o exemplo de alguém que soube impor ao mundo as suas convicções, ao mesmo tempo que defendeu sem esmorecer o interesse do seu país. Não hesitou em combater e derrotar os generais argentinos, que se tinham atrevido a atacar as Malvinas sem aviso. Exigiu a devolução do cheque britânico à Comunidade Europeia, obrigando Delors, a quem ela chamava o líder dos funcionários não eleitos, a ceder. E no fim soube opor-se à entrada da Grã-Bretanha no euro, avisando que a Europa só teria uma moeda única quando desaparecesse a Câmara dos Comuns. Nenhum inimigo externo a vencia, pelo que apenas caiu pela desistência dos seus próprios seguidores, que a quiseram substituir por um John Major sem chama. Quando hoje assistimos a governantes sem qualquer convicção, totalmente submissos a imposições externas, temos saudades de personalidades como Margaret Thatcher. Afinal se a Grã-Bretanha não entrou na armadilha do euro que sufoca toda a Europa é a ela que o deve.
A melhor homenagem que lhe foi feita consistiu no nome Dama de Ferro, que curiosamente lhe foi atribuído pelos russos quando ainda era líder da oposição, devido à violência dos ataques que lhes deferia. Ela não hesitou em assumir o epíteto: "Os meus inimigos chamaram-me Dama de Ferro. Estão absolutamente certos. Sou-o mesmo". Dificilmente a Grã-Bretanha voltará a ter um líder dessa grandeza.
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O regressado Sócrates.
Esse capital permite-lhe agora um regresso em força. O que se passou nesta semana demonstrou claramente quem é o líder da oposição. Como o Pedro bem refere abaixo, António José Seguro mostrou ser um autêntico vácuo político, apresentando uma moção de censura que só serviu para legitimar o Governo, e revelando-se incapaz de apresentar qualquer solução para os problemas nacionais. Apesar disso, acha que deve ser nomeado Primeiro-Ministro, mas mais ninguém no país parece ter a mesma opinião.
Pelo contrário, José Sócrates mostrou como se combate eficazmente a maioria, arrastando pelo caminho o Presidente. Quando Passos Coelho foi pedir o apoio de Belém e Cavaco lho deu, o Presidente ligou-se ao destino deste Governo. Com isso deixou de ter condições para arbitrar qualquer outra solução governativa. Sócrates não perdoou e do alto da sua tribunal televisiva resolveu atacar Passos Coelho e Cavaco simultaneamente, passando a considerar o Governo como de iniciativa presidencial. Com isso conseguiu matar dois coelhos de uma só cajadada. Passos Coelho e António José Seguro são a partir de hoje actores menores. Cavaco passou a líder da maioria e José Sócrates é o líder da oposição. A vingança é um prato que se come frio e este vai ser servido gelado.
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O tempo da justiça.
Sobre o conteúdo do acórdão do Tribunal Constitucional, e a desilusão que senti com o mesmo, já me pronunciei aqui. Saliento agora é a afirmação do seu Presidente que considera "profundamente injustas" as críticas à demora na decisão, achando normal deixar um país em suspenso três meses com uma decisão desta importância. A justificação é a de que "o tempo da justiça não é o tempo da política, nem o do jornalismo". Alguém que explique então porque é que a decisão do Tribunal Constitucional não podia ser anunciada antes da moção de censura do PS e por que razão é que a mesma surge numa sexta-feira à noite, numa altura em que os mercados estão fechados até segunda-feira. O Tribunal Constitucional tem de facto um tempo muito próprio para se pronunciar, e que é independente de todo e qualquer outro factor.
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O Governo em ruínas.
O problema deste Governo foi desde o início um e apenas um: uma estrondosa falta de liderança. Tal resulta do óbvio défice de competências que Passos Coelho tem para Primeiro-Ministro, uma vez que lhe falta simultaneamente capacidade política e competência económica. Precisamente por isso o Governo que formou assentava em dois pilares principais: Miguel Relvas para a área política e Vítor Gaspar para as finanças. Um dos pilares ruiu hoje e o golpe no Governo é de tal ordem que Passos Coelho nem foi capaz de indicar o substituto. O outro pilar, já muito esboroado, pode cair amanhã se o Tribunal Constitucional trucidar o orçamento de Estado.
Miguel Relvas teve habilidade política suficiente para fazer Passos Coelho chegar a Primeiro-Ministro, mas no Governo tomou decisões completamente erradas. Contratou António Borges como consultor, com carta branca para as privatizações, que se revelaram um desastre. Reduziu a reforma das autarquias a uma extinção de freguesias à vontade dos fregueses. De caminho deixou-se enredar em casos pitorescos como espiões, ameaças a jornalistas, licenciatura, etc. No fim ainda conseguiu pôr as candidaturas autárquicas do PSD em combate com os tribunais, para gáudio dos adversários. Era manifesto que já não trazia qualquer vantagem política ao Governo, pelo que deveria ter saído há muito tempo. Sai agora na pior altura possível nas vésperas da decisão do Tribunal Constitucional, ao que se diz por causa de um relatório sobre a Lusófona que já estaria na posse do Governo há meses. A ser assim, é provável que arraste igualmente Nuno Crato na queda.
Vítor Gaspar é igualmente um caso perdido como Ministro das Finanças, como aliás se viu desde o seu primeiro discurso, quando anunciou impostos extraordinários em lugar de cortes de despesa, tendo prosseguido nessa senda, contra tudo e contra todos. Amanhã se verá se o Tribunal Constitucional lhe permite manter um mínimo do inacreditável Orçamento de Estado que concebeu, ou se o caso já não tem remédio, tendo que arrumar igualmente as pastas.
A ruína deste Governo tem, no entanto, apenas um culpado: Passos Coelho. Foi o seu défice de coordenação e supervisão que deu carta branca a Gaspar para inventar as medidas económias mais loucas possíveis, como a TSU, e permitiu a continuação de Miguel Relvas no Governo até ao limite do insustentável. Um Primeiro-Ministro que coordenasse efectivamente os Ministros nunca teria deixado as coisas chegarem a este ponto. É por isso que não me alegra nada a demissão de Miguel Relvas, aliás substituído pelo vazio absoluto. Ficaria satisfeito era com a demissão de Passos Coelho. É tempo de a maioria arranjar outro Primeiro-Ministro. Se não, será a oposição a fazê-lo.