António Costa e os media.
Ontem escrevi aqui que politicamente o avanço de António Costa era imparável e que só a blindagem dos estatutos realizada por António José Seguro o estava a conseguir travar processualmente. Uma das razões para esse avanço de Costa é a sua habitual boa imprensa e o extraordinário acesso aos media, coisa que Seguro nunca teve. Basta lembrar que, para ser entrevistado numa altura em que ganhou o congresso, Seguro teve que interromper uma entrevista de Costa, coisa que este nunca lhe perdoou e que explica bem as razões de consciência que ditaram o seu avanço nesta altura.
Em termos de acesso aos media, António Costa não apenas dispõe de um debate semanal na quinta-feira com dois adversários que já o reconhecem como líder natural do seu partido, como ainda ontem foi chamado pela Sic Notícias a uma entrevista à terça-feira, noticiando os media amplamente o seu percurso triunfante pelo país. Quanto a Seguro, apesar de ter apelado a debates com Costa, nenhuma televisão os organizou, nem sequer convidou Seguro para uma simples entrevista. É evidente que, nas tais absurdas "primárias" que convocou, Seguro vai ser trucidado sem ter sequer oportunidade para dizer um "ai".
Entretanto António Costa já começa a dizer ao que vem e é o pior que se poderia esperar. Agora veio dizer que o IMI dos lisboetas é que vai servir para pagar os prejuízos das empresas de transportes, podendo esse IMI até aumentar. Neste momento, os cidadãos já têm o IMI em valores estratosféricos, multiplicam-se as execuções fiscais, e grande parte das pessoas vai perder as suas casas por não conseguir pagar o imposto, mas isto não interessa nada. O que interessa é que a Câmara possa adquirir empresas de transportes com dívidas colossais, nem que para isso tenha que desbaratar o dinheiro dos contribuintes. Transponha-se isto para a escala nacional e ficamos a saber que um governo de António Costa pode ser ainda mais catastrófico para o país que o de Sócrates foi. Sinceramente neste momento, entre Costa e Seguro, já não sei qual dos dois é pior.
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Contas.
Já Vasco Pulido Valente tinha aqui referido que "qualquer indivíduo com mais de seis neurónios pode ver que a aventura da selecção portuguesa duplica em miniatura a aventura do défice e da dívida. Primeiro, o silêncio, até cairmos sem remédio no fundo do poço. A seguir, o espanto fingido ou a corajosa afirmação de irresponsabilidade. E, no fim, acusações sobre acusações, para disfarçar o facto de que toda a gente colaborara no desastre. Nós, como Ronaldo, somos manifestamente os “melhores do mundo”. Só que, de quando em quando, nos cai a Alemanha na cabeça ou uma dívida inexplicável, que levará a pagar 30 e tal anos". Eu acrescento algo mais. Depois do desastre, começamos a fazer contas, julgando poder obter o impossível, seja ele a qualificação para os oitavos-de-final ou o pagamento da dívida. Da mesma forma que os partidos do arco da governação, com Cavaco Silva à cabeça, acham que conseguimos reduzir a dívida para 60% do PIB em 2035, bastando para isso, imagine-se obter um saldo primário do PIB de 3% em todos esses anos, na selecção anda-se agora a fazer contas para o apuramento para a fase seguinte.
Essas contas em ambos os casos não passam, porém, de um sonho de uma noite de Verão. No caso da selecção, era preciso que uma equipa de aleijados, cujos jogadores ficam lesionados aos primeiros minutos em campo, fosse golear por 5-0 uma das equipas mais fortes fisicamente deste campeonato. Mas depois ainda era necessário que a Alemanha ganhasse aos EUA, sabendo-se que a tendência natural dessas duas equipas, que ainda por cima têm dois treinadores alemães, vai ser jogar para o empate, que as apura a ambas, e as poupa para a fase seguinte. Dizer que neste caso o apuramento é possível é tão absurdo como dizer que Portugal vai pagar a dívida, sabendo-se que para isso precisa de um saldo primário que nunca foi obtido e que é apenas 10 vezes o esperado para este ano de 2014. Como dizem os brasileiros, caiam na real.
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De novo a selecção.
Há uma coisa que me parece evidente depois de comparar o jogo da nossa selecção com o das outras equipas no Mundial. É que, com a excepção de Éder, os nossos jogadores não correm, parecendo andar apenas a passear pelo campo, razão pela qual só fazem passes longos. Ora, a velocidade do jogo é absolutamente essencial para se fazer qualquer resultado positivo no Mundial. Havia um treinador que dizia que antes de tudo queria jogadores que corressem e só depois que soubessem jogar futebol. Aqui o que sucede é que se um jogador português começar a correr, fica logo lesionado. Nem sequer ficamos a saber que futebol ele afinal joga.
É por isso que a responsabilidade de tudo isto está essencialmente na escolha dos jogadores feita por Paulo Bento. Efectivamente, ao optar por nomes consagrados, mas em fim de carreira, Paulo Bento conseguiu ter a selecção mais idosa do Mundial e manifestamente sem condição física para disputar os jogos. Alguma vez pode ser normal que um país, no seu jogo inicial do Mundial, perca logo três jogadores por lesão? E já se pensou nos custos, e não apenas desportivos, que isto implicou para o país?
O que espanta, no entanto, é que ninguém assuma a responsabilidade disto. Há uns anos o Brasil foi trucidado na final do campeonato do mundo de 1998 pela França, porque Ronaldo foi posto a jogar depois de ter tido convulsões na noite anterior. Obviamente nada fez em campo, parecendo completamente perdido, acabando o Brasil a perder por 3-0. Constou que só tinha jogado porque havia um patrocinador que tinha ameaçado cancelar o patrocínio se ele não jogasse. Todo o Brasil exigiu naturalmente que as responsabilidades fossem apuradas. Aqui o que recebemos é esta mensagem a pedir para os portugueses continuarem a acreditar na selecção. Qual selecção?
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O declínio do Ocidente.
Enquanto anda tudo entretido com o Mundial há alguma coisa de novo a Leste. Em primeiro lugar, depois dos seus sucessos na guerra civil síria, a Al-Qaeda ameaça agora tomar conta do Iraque, pretendendo construir desde já um Estado islâmico radical nesse território, denominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIL, na versão inglesa). Será algo absolutamente novo e que demonstrará uma derrota absoluta dos Estados Unidos na denominada guerra contra o terrorismo. Na verdade, o que era até há pouco tempo apenas uma organização terrorista, com recursos consideráveis, é certo, mas sem qualquer base territorial, pode a partir de agora começar a gerir um Estado, a partir de território sírio e iraquiano, iniciando a realização da sua ambição de reconstituir o califado. Trata-se de algo muito mais ameaçador do que qualquer Saddam Hussein, mas a verdade é que Barack Obama não se mostra disposto a nova intervenção militar no Iraque, preferindo deixar os iraquianos à sua sorte. Aposto que vão ser presa fácil para a Al-Qaeda e que em breve um país com a importância estratégica do Iraque estará a servir para o desenvolvimento do terrorismo.
Na Ucrânia as coisas não estão melhores. Poroshenko, legitimado pela sua vitória eleitoral e estimulado pelo apoio da União Europeia, achou que uma situação altamente complexa como a que herdou podia ser resolvida com uma simples bravata. Garantiu resolver a questão no Leste numa semana, através de uma ofensiva brutal contra os rebeldes russos. A iniciativa era ridícula, uma vez que a manutenção do Leste ucraniano depende muito mais de concessões aos rebeldes, depois da desconfiança criada pelo golpe de Estado, do que de uma ofensiva militar. Era evidente que a Rússia não toleraria um massacre dos rebeldes pró-russos. Mas a reacção de Putin, apesar de curiosamente contida, foi extremamente eficaz. Limitou-se a cortar o gás à Ucrânia, matando com isso dois coelhos de uma só cajadada. Efectivamente, não apenas a Ucrânia vai ser economicamente muito prejudicada, como especialmente a Europa vai morrer de frio no Inverno, o que seguramente lhe vai arrefecer os ímpetos de intervir em zonas que Putin considera de influência russa. Naturalmente que, depois dessa resposta, a Poroshenko nada mais restou do que ir negociar com Putin, engolindo assim a bravata inicial.
De tudo isto resulta que estamos a assistir neste século XXI a um profundo declínio do Ocidente, associado a um ressurgimento islâmico e ao regresso da Rússia. E neste aspecto ter uma União Europeia exclusivamente dominada pela Alemanha é altamente contraproducente. Uma União Europeia só poderia ter força se efectivamente congressasse os povos europeus. Mas hoje, quando os líderes europeus acham que podem ignorar os votos dos cidadãos e escolher o Presidente da Comissão numa canoa num lago sueco, parece evidente que a Europa está neste momento a meter muita água. Por este caminho arrisca-se a ir ao fundo.
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Objectividade jornalística.
Ronaldo hoje somos NÓS que temos a musculatura de vencedores.
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Estratégia brilhante.
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O desemprego.
Este belíssimo texto de Pedro Santos Guerreiro justifica uma análise sobre um drama que tem vindo a atingir profundamente as sociedades desenvolvidas e que consiste no problema do desemprego. Não consigo compreender — e acho um erro político grave — que se cantem loas ao "sucesso" do programa de ajustamento e se prometa que um dia — seguramente daqui a muitos anos — chegarão os gloriosos amanhãs que cantam e lá acabaremos por atingir as terras de leite e mel do equilíbrio imposto pelo Tratado Orçamental. Mas nesse glorioso processo de "ajustamento", cada vez mais exigente, chega sempre algo que todos os economistas avisam: níveis de desemprego sem precedentes neste país. Não é o facto de as estatísticas apresentarem um ponto a mais ou a menos, que impede o impacto brutal de notícias como esta, que normalmente significam que o flagelo chegou a amigos e conhecidos. As pessoas angustiam-se e perguntam se não serão o próximo na lista. É por isso que a maior boutade alguma vez dita por Passos Coelho foi quando disse que o desemprego era uma oportunidade para mudar de vida.
Neste âmbito, um dos filmes que vi retratar com mais brilhantismo o desemprego, a propósito da crise financeira dos EUA, foi Homens de Negócios (The Company Men), com Ben Affleck e Tommy Lee Jones. O filme retrata a história de um executivo, com um bom emprego, que um dia chega à empresa alegre depois de um jogo de golfe, recebendo a notícia de que iria ser despedido. Assistimos então ao completo desmoronar da vida dessa pessoa, sendo que não é o único, uma vez que todos os dias a empresa vai mandando novas pessoas para o desemprego. A justificação que o administrador dá é simples: a empresa está a ser objecto de uma OPA, que só se conseguirá frustrar valorizando as acções e para isso é necessário reduzir os custos laborais. Nessa luta contra a OPA, a empresa vai sucessivamente despedindo mais e mais trabalhadores, lançando as suas famílias no desespero. Até que, depois de os despedimentos se terem multiplicado, o administrador diz que afinal a empresa não conseguiu resistir e a administração vai aceitar a OPA. Quando alguém lhe diz que lamenta esse fracasso, o administrador responde que não se justifica o lamento, pois as suas acções, que irá alienar na OPA, valem agora 600 milhões de dólares.
Aí somos levados a perguntar o seguinte: qual é a lógica disto tudo? Que interessa que alguém receba 600 milhões de dólares ou metade dessa importância, já que uma pessoa normal nem em toda a sua vida gasta valores dessa ordem? E o resultado disto é que o desemprego acumula-se e o tecido empresarial vai sendo destruído numa lógica de capitalismo de casino. Seguramente que alguma coisa se perdeu do espírito original do capitalismo. Os verdadeiros empresários criavam riqueza e sentiam-se responsáveis pelo bem-estar dos seus trabalhadores. Hoje a lógica passou a ser apenas comprar e vender acções, valendo tudo para se obter o melhor preço. Resta saber a que custo.
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Eleições antecipadas?
As eleições europeias demonstraram, para quem tivesse alguma dúvida, que afinal o país é terreno fértil para o surgimento de novos partidos e movimentos, a partir do momento em que os partidos do arco da governação não conseguem encontrar alternativas à actual situação. Na verdade, PS e PSD continuam amarrados à ortodoxia europeia e dela não conseguem sair, mesmo quando a União Europeia se vai paulatinamente transformando numa instituição antidemocrática, gerida pela Alemanha. O facto de Merkel e Cameron terem discutido sem problemas uma alternativa a Juncker, mesmo depois da farsa que foi a sua apresentação como candidato nas eleições europeias, diz bem daquilo que é hoje a União Europeia.
Impossibilitado de encontrar uma alternativa à sua política actual, o PSD decidiu agora entrar numa guerra contra o Tribunal Constitucional, de que esta entrevista de Teresa Leal Coelho é o mais recente exemplo, onde chega a ameaçar os juízes com sanções, a fazer lembrar Afonso Costa na I República. É preocupante a forma como o Presidente tem lavado as mãos destes ataques, mas o que é duvidoso é se ficarão por aí. Na verdade, isto pode ser uma tentativa de o Governo antecipar as eleições legislativas, alegando impossibilidade de governar, perante novos chumbos do Tribunal Constitucional. Cavaco também pode estar a preparar essa solução, alegando a impossibilidade de a actual legislatura conseguir o consenso que voltou ontem a exigir. Ora, eleições legislativas neste momento poderiam ser dramáticas para o PS, embrulhado num longo conflito interno, e com um líder que todos os dias perde terreno, mas que seria apesar disso o candidato a primeiro-ministro.
É por isso que tenho defendido que António Costa cometeu um sério erro político quando aceitou primárias no PS, em lugar de exigir o Congresso, erro que só agora está a tentar corrigir, mas que não sei se ainda irá a tempo. Na verdade, com esta história das primárias, o PS vai ficar durante meses em posição altamente vulnerável, e será grande a tentação dos partidos da maioria de aproveitar a situação para desencadear já eleições. Claro que há o simbolismo de a coligação levar pela primeira vez uma legislatura até ao fim, mas não me parece que esse simbolismo valha mais do que a continuação dos partidos da maioria no poder. No fundo o raciocínio poderá ser este: se o PS de Seguro nunca foi alternativa, porque não fazer eleições no último momento em que este continuará a não o ser?