Citação clássica
A propósito disto recordo uma citação clássica: "Donec eris felix, multos numerabis amicos; tempora si fuerint nubila, solus eris" (Ovidius, Tristia, I, 9, 5,).
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A tragédia do PS.
Depois de Mário Soares, apenas José Sócrates conseguiu atingir o estatuto de líder incontestado do PS. Efectivamente, a sombra de Mário Soares pairou sempre sobre todos os outros líderes do PS. Constâncio demitiu-se, acusando Mário Soares de interferência na sua liderança. Depois Soares apoiou a ascensão de Guterres contra Jorge Sampaio, para logo a seguir patrocinar um Congresso "Portugal, que futuro?", destinado a demonstrar que era melhor líder da oposição que Guterres. Quando Guterres chegou a Primeiro-Ministro, Mário Soares chegou ao ponto de declarar estar contra a regionalização no referendo patrocinado por Guterres.
Já José Sócrates chegou ao poder apoiado numa forte maioria absoluta, o que lhe deu uma legitimidade própria, que pela primeira vez permitia a um líder do PS sair da sombra de Soares. José Sócrates, porém, nunca afrontou Soares, tendo inclusivamente aceite apoiar uma sua recandidatura à presidência, aos 81 anos, quando era evidente que não tinha quaisquer condições de derrotar Cavaco Silva. É por isso normalíssimo que Soares tenha ido espontaneamente a Évora visitar Sócrates, o que só demonstra elevação de carácter. Soares nunca deixa cair os seus amigos, tendo mesmo, quando era Presidente da República, visitado Bettino Craxi no seu exílio na Tunísia em fuga às condenações da justiça italiana. Outros políticos podem preocupar-se com a sua imagem pessoal ou com as conveniências partidárias. Soares não se move por esses critérios.
Curiosamente Sócrates acabou por deixar sobre o PS uma sombra semelhante à de Soares. António José Seguro era opositor declarado de Sócrates e bem lutou contra a sua influência no partido, mas os apoiantes de Sócrates acusaram-no sistematicamente de pôr em causa o legado do seu querido líder. Apesar dos insistentes pedidos destes, António Costa recusou-se sistematicamente a avançar, até ao momento em que percebeu, na noite das europeias, que António José Seguro já tinha conseguido consolidar a recuperação do PS e iria ser o próximo Primeiro-Ministro, o que quebraria definitivamente a influência de Sócrates. António Costa minizou por isso a vitória eleitoral, dizendo que lhe "sabia a pouco" em comparação com os resultados conseguidos por Sócrates. Bastou essa declaração para que o PS lhe caísse nos braços, saudoso dos tempos gloriosos do anterior líder. Eduardo Ferro Rodrigues proclamou logo no Parlamento que o legado de Sócrates voltava a ser respeitado no partido.
É por isso que, Independentemente da presunção de inocência do visado, a detenção de José Sócrates é politicamente mortífera para o PS. Quando tinha acabado de proclamar o retorno ao legado de Sócrates, a última coisa de que este partido precisava era de ser confrontado com acusações de corrupção no governo cujas qualidades não cessava de louvar. Precisamente por isso vários militantes começaram mais uma vez a enveredar por teses da cabala, levando a que António Costa tivesse que comandar as hostes, ordenando a todos os militantes que se afastassem de Sócrates para preservar o PS da situação que o envolvia.
Só que se assistiu imediatamente a uma revolta em directo protagonizada por Mário Soares. Este foi imediatamente visitar Sócrates à prisão e proclamou do alto dos seus jubilosos 90 anos que "todo o PS está contra esta bandalheira". António Costa sentiu claramente o desafio, assim como antes dele já tinham sentido Constâncio, Sampaio e Guterres, mas permaneceu mudo e quedo perante este ataque de Mário Soares que poderia incendiar o PS contra ele próprio.
Curiosamente, quem sentiu necessidade de reagir em auxílio de António Costa foi o próprio Sócrates. Num inédito comunicado, proferido ao início da noite, proclamou: "Este processo é comigo e só comigo. Qualquer envolvimento do Partido Socialista só me prejudicaria, prejudicaria o Partido e prejudicaria a Democracia".
O que se passou ontem revela assim que não só que António Costa não escapa à sombra de Soares, ao contrário do que sucedia com Sócrates, como também que, mesmo a partir da prisão, a sombra de Sócrates paira igualmente sobre a sua liderança. Uma verdadeira tragédia para o PS na altura em que tudo apontava para uma ascensão imparável em direcção ao poder. António José Seguro é que se deve estar a rir.
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O Bloco Central de interesses.
Esta votação demonstra já o que se perspectiva para o próximo governo. Efectivamente, apeado António José Seguro, o PS de António Costa está inteiramente vocacionado para um governo de bloco central, juntamente com o PSD, apostado em satisfazer os interesses do costume, especialmente os dos políticos. Os funcionários públicos perderam até 10% dos seus salários e tanto Passos Coelho como António Costa só os prometem devolver nas calendas gregas. Mas entretanto repõem aos seus amigos uma imoral subvenção vitalícia, obtida ao fim de 12 anos de "trabalho" no parlamento. São estes privilégios dos políticos que os sacrifícios dos cidadãos pagam. Tenham vergonha.
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A independência da Catalunha.
Os argumentos expostos em sentido contrário fazem-me revisitar a questão da independência da Catalunha. A meu ver é manifesto que a tentativa de manter a unidade de Espanha artificialmente faz tão pouco sentido como a imagem deste cartoon. É evidente que a Espanha é um estado com várias nações, pelo que só faz sentido a sua união enquanto as diversas nações que o compõem o desejarem. Se alguma quiser sair, não há outra alternativa que não a de respeitar a vontade do seu povo.
A verdade é que a Catalunha organizou uma consulta com grande participação em que a esmagadora maioria dos votantes se pronunciou a favor da independência. Querer alterar este resultado contando as abstenções como votos contra é profundamente antidemocrático. Em todas as eleições quem decide é quem vai votar.
A independência da Catalunha contraria a constituição espanhola? Claro que sim. Assim como a independência do Brasil contrariava a constituição portuguesa de 1822 e a dos PALOP a constituição portuguesa de 1933 que declaravam esses países como território português. A Constituição espanhola declara a indissolúvel unidade da Nação espanhola (art. 2º) e até obriga todos os espanhóis a saber castelhano (art. 3º). Podem é os catalães querer deixar de ser espanhóis e tratar o castelhano como a língua estrangeira que para eles é.
A Catalunha nunca foi independente? Pois não, mas também não o foram a Eslovénia, a Eslováquia e a República Checa. A Croácia não é independente desde o séc. XI e hoje todos estes Estados são independentes no quadro da União Europeia. Que motivos há para negar esse direito à Catalunha?
Quanto a Portugal será com certeza muito mais influente numa península com várias nações do que com uma Espanha artificialmente unida. Os riscos da independência da Catalunha não devem assustar ninguém. Por esse critério tínhamos estado contra a queda do muro de Berlim. Manter o status quo a todo o custo é um objectivo inútil. Como disse Helmut Kohl, quem chegar atrasado será vencido pela história.
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O Costa das taxas e taxinhas.
Mais uma vez se verifica que são sempre os munícipes a pagar os custos da irresponsabilidade financeira dos municípios, sendo que qualquer pretexto serve para inventar taxas que não correspondem à contrapartida de qualquer serviço público prestado, e que por isso não passam de impostos encapotados. Um exemplo típico é a protecção civil, que é uma função geral do Estado, e que por isso já é paga nos impostos, não podendo servir de pretexto ao lançamento de taxas. Depois de Portimão já ter adoptado esta estratégia, com justo repúdio por parte da população, agora é a Câmara de Lisboa que vem mais uma vez ao bolso dos munícipes. Não deixa de ser curioso que essa taxa seja anunciada no dia em que as chuvas voltaram a causar estragos na capital, mostrando afinal para que serve a célebre taxa de conservação de esgotos, que nos últimos anos tem crescido em progressão geométrica.
Com isto António Costa confirma o que já tínhamos salientado. A sua estratégia é a de subida contínua dos impostos, sendo que neste âmbito o céu é o limite, mesmo quando gere uma Câmara que recebeu do Estado verbas colossais pelos terrenos do aeroporto. E por isso vai inventando sucessivamente novas receitas, mesmo que seja para as meter em projectos ruinosos, como o de adquirir as empresas de transportes. Isto transposto para a gestão do país fará o "enorme aumento de impostos" de Vítor Gaspar parecer uma brincadeira de crianças, mesmo que os impostos sejam apelidados convenientemente de "taxas" ou "taxinhas", na imortal expressão de Pires de Lima. O drama é que a inépcia total do governo e da maioria que o suporta vai dar a António Costa a oportunidade para castigar todos os portugueses da forma como está a castigar os lisboetas.
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Tot per Catalunya.
Nunca percebi porque é que em Portugal a opinião geral vai no sentido de defender a todo o custo a unidade de Espanha, quando é óbvio que existem mais nações na península, sendo uma delas indubitavelmente a Catalunha, onde se realizou agora uma esmagadora votação a favor da independência. Afinal de contas, em 1640 tanto Portugal como a Catalunha lutavam pela sua independência, tendo sido a prioridade dada pelos espanhóis ao controlo da revolta catalã que permitiu a Portugal obter a sua libertação. É por isso mais que tempo de essa injustiça histórica ser corrigida, reconhecendo-se à nação catalã o direito a ter um Estado soberano. Como se escreveu no texto da Declaração de Independência dos Estados Unidos, "it becomes necessary for one people to dissolve the political bands which have connected them with another, and to assume among the powers of the earth, the separate and equal station to which the Laws of Nature and of Nature's God entitle them". Pela minha parte a resposta é simples: Tot per Catalunya.