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Cristalino!

Quinta-feira, 29.09.16

Acompanhei com bastante cepticismo a euforia nacional em torno do "sucesso" da candidatura de António Guterres à ONU, expressa em sucessivas votações. Sempre achei que essas votações não serviam absolutamente para nada, uma vez que a Realpolitik é que iria decidir quem iria ser o Secretário-Geral da ONU. E, por isso, a figura dos candidatos a responder a interrogatórios sucessivos "para inglês ver" é perfeitamente patética.

 

Neste momento, por razões geopolíticas, está assente que o próximo secretário-geral da ONU deverá vir da Europa Oriental e que deverá preferentemente ser uma mulher. Não faz por isso qualquer sentido esperar que um homem da Europa Ocidental possa ganhar a eleição. Mesmo que ganhe todas as votações, haverá sempre um veto de um membro permanente a inviabilizar a ascensão ao cargo. E não vale a pena falar em violação às regras democráticas: a ONU não é uma democracia já que, se o fosse, não haveria direito de veto.

 

A questão tem paralelo com o que se passou com o austríaco Kurt Waldheim em 1981. Tendo sido indiscutivelmente um bom secretário-geral da ONU, cumpriu dois mandatos à frente da organização com o agrado geral. Quando se tentou recandidatar a um terceiro mandato, surpreendentemente surgiu o veto da República Popular da China. Era o único país que se opunha à reeleição, pelo que Waldheim insistiu. 16 vezes se apresentou a votos e 16 vezes a China o rejeitou. A justificação para o veto foi apenas esta: Waldheim fora um excelente secretário-geral, mas em 35 anos da organização esse cargo fora ocupado durante 25 anos por homens do ocidente. Agora a China queria um secretário-geral oriundo do terceiro mundo. E assim Waldheim acabou por retirar a sua candidatura, tendo sido eleito o peruano Javier Pérez de Cuellar, que teve um mandato sem qualquer brilho à frente da organização.

 

Portanto, não vale a pena os nossos políticos fazerem de virgens ofendidas, e proclamarem a sua indignação pela entrada na corrida de Kristalina Georgieva, que já se percebeu muito bem que vai ser a escolhida. Aliás, já se sabia desde o início que, a bem ou a mal, o próximo secretário-geral será da Europa do Leste. Um dos maiores problemas actuais na esfera internacional é a ascensão da Rússia, e é necessário um secretário-geral que possa fazer a ponte entre a Rússia e o Ocidente, essencial para resolver antes de tudo o conflito na Síria. Neste quadro não é o currículo de Guterres na área dos refugiados que lhe permite qualquer expectativa de ascender ao cargo. Como ele próprio costuma dizer: "é a vida!". Na verdade, ele de nada se pode queixar que isto desde o princípio foi sempre absolutamente cristalino.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 07:57

Uma figura ridícula.

Terça-feira, 27.09.16

Se há coisa que acho que não deve preocupar um único português é a "discriminação" de que Durão Barroso diz ser alvo pelo tratamento que a Comissão Europeia lhe passou a dar depois de ter ido para a Goldman Sachs. Durão Barroso está habituado a assumir as consequências das decisões de carreira que toma. Ele próprio tem consciência de que o povo português nunca lhe perdoou o ter abandonado o barco do governo para ir para Bruxelas, com as consequências que se sabe e que o país pagou muito caro. Não é de estranhar por isso que na Comissão Europeia também não lhe perdoem mais esta estranha transição.

 

Não é o facto de outros membros da Comissão terem anteriormente estado na Goldman Sachs que justifica alguma vez a atitude de Barroso. A indicação de exemplos de anteriores comissários que também se albergaram na Goldman Sachs só me faz lembrar aquele programa cómico brasileiro, em que quando alguém era criticado por alguma coisa, desatava a berrar: "Mas sou só eu? Cadê os outros?".

 

Mas António Costa, que tem feito tantas malfeitorias nos últimos tempos, resolveu aproveitar este assunto para fazer uma bravata nacionalista, e resolveu pedir esclarecimentos a Juncker "sobre a decisão tomada relativamente ao Dr. Durão Barroso, comparativamente a outros antigos membros da Comissão", uma vez que era "necessário assegurar e garantir que nenhum português é objecto de qualquer tipo de atitude discriminatória". Parece assim que a Comissão Europeia responderia perante o Primeiro-Ministro português e que qualquer funcionário português, desde o varredor das escadas ao ex-Presidente da Comissão, poderia contar com a intervenção marialva do Dr. António Costa para o proteger, se alguma vez se sentisse discriminado.

 

Mas, como não poderia deixar de ser, a Comissão Europeia já respondeu a António Costa que tivesse juízo e que trataria desse assunto directamente com Durão Barroso. Quanto a António Costa, há apenas duas perguntas a fazer: Primeira, ele não tem consciência da figura ridícula que fez? Segunda, não há assuntos na Europa mais preocupantes para o Primeiro-Ministro de Portugal do que o tratamento que a Comissão Europeia decide dar ao seu ex-Presidente?

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publicado por Luís Menezes Leitão às 10:53

Sugestões para as comemorações do 10 de Junho.

Quinta-feira, 22.09.16

Leio aqui que o Presidente Marcelo promete comemorar o 10 de Junho fora do país "ano após ano". E que o Primeiro-Ministro António Costa naturalmente concorda com a iniciativa. Assim, depois de Paris ("teremos sempre Paris!"), deixo já aqui as minhas sugestões para os locais a escolher para as próximas comemorações do 10 de Junho:

2017: Las Vegas.

2018: Ilhas Maldivas.

2019: Bora-Bora.

2020: Ilhas Seychelles.

Justifica-se plenamente a escolha destes lugares para as comemorações do 10 de Junho, uma vez que haverá de certeza pelo menos um português em Junho em qualquer desses locais. E onde está um português está Portugal. Já se vê que vamos passar a ter uns 10 de Junho muito mais agradáveis.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 08:16

Antes tarde do que nunca!

Quarta-feira, 21.09.16

A polémica sobre o livro de José António Saraiva mostrou infelizmente ao público o pior de Pedro Passos Coelho: a precipitação, a ligeireza e a teimosia. Só a precipitação pode explicar que o líder da oposição de um país, que aspira a voltar a ser primeiro-ministro, aceite apresentar um livro sem sequer o ler. Só a ligeireza explica que, confrontado com o teor do livro, viesse desvalorizar o assunto, não se apercebendo da gravidade do mesmo. E por fim, só a teimosia pode explicar as suas declarações públicas a insistir na apresentação do livro, quando era para todos evidente que o mesmo não poderia ser apresentado.

 

Qualquer líder partidário tem obrigação de pensar nos interesses do partido que lidera antes de toda e qualquer consideração pessoal. O PSD tem o legado de Sá Carneiro, que nunca permitiu que a vida íntima dos adversários fosse explorada, mesmo quando ele próprio sofria ataques em razão da sua vida privada. Nunca um líder do PSD poderia por isso apadrinhar um livro com referências à vida íntima de políticos. Passos Coelho deveria ter sido o primeiro a reconhecer essa situação. Como pelos vistos não foi o caso, ainda bem que alguém lhe explicou o óbvio e ele finalmente percebeu. Antes tarde do que nunca!

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publicado por Luís Menezes Leitão às 07:16

Há limites para tudo.

Sexta-feira, 16.09.16

Não li o livro e não gosto de fazer juízos antecipados sobre algo que não conheço. Se de facto se confirmar que é o quem tem vindo a público, trata-se de um objecto absolutamente inqualificável, a merecer o mais vivo repúdio.

Quanto à atitude de Passos Coelho em o ir apresentar, também a ser verdade que isso vai acontecer, parece-me que o qualificativo de amadorismo é muito suave. Nem que se tratasse de uma obra-prima a merecer o prémio Nobel — e acho que o autor tinha pretensões a tal — um ex-Primeiro-Ministro não se pode prestar a essa figura, uma vez que é muito mais do que um apresentador de livros. As pessoas têm que ter respeito pelo seu próprio passado e não devem deslustrar o que já foram.

Agora, se o livro é de facto o que dizem e se, apesar disso, Passos Coelho insiste em o apresentar, acho que é preciso pensar seriamente se ele está de facto em condições de voltar a ser candidato a Primeiro-Ministro. É que nem a um candidato a membro de junta de freguesia deve um partido político permitir semelhante disparate, quanto mais a um candidato a Primeiro-Ministro. Há limites para tudo e sinceramente acho que este espectáculo os vai ultrapassar a todos.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 16:20

O estatuto de Durão Barroso.

Terça-feira, 13.09.16

Leio aqui que Durão Barroso diz que está a ser "discriminado", ele e o Goldman Sachs, por a Comissão Europeia o ter passado a considerar um simples "lobista", em lugar de lhe manter a passadeira vermelha de ex-Presidente da Comissão Europeia. Parece que no PSD há muita gente que concorda com ele, mas o prémio para a defesa mais criativa vai para Paulo Rangel, que considera isto uma conspiração para prejudicar a candidatura de Guterres à ONU. Cuidado, portugueses, que os bandidos da Comissão Europeia actual (a anterior era impecável!) querem prejudicar um dos nossos concidadãos, ao dar o estatuto de lobista a outro.

 

Ora, aqui está um combate político que vale a pena ser travado. É preciso lutar arduamente contra a infame discriminação a que estão sujeitos os grandes bancos de investimento e os seus contratados. Temos que exigir que o presidente não executivo do Goldman Sachs não seja discriminado e possa manter o estatuto de ex-presidente da Comissão Europeia. E não interessa nada que a sua ida para o Goldman Sachs tenha sido um choque para os funcionários europeus. Esses funcionários têm que perceber que não podem prejudicar as expectativas de carreira dos ex-presidentes da Comissão Europeia. Afinal de contas, e como disse Marcelo Rebelo de Sousa, ir para o Goldman Sachs é atingir "o topo da vida empresarial", sendo uma maravilha ver "portugueses reconhecidos em lugares cimeiros".

 

Faço uma avaliação muito negativa dos mandatos de Durão Barroso à frente da Comissão Europeia, um tempo em que esta se apagou completamente, deixando a Europa nas mãos do eixo franco-alemão. Mas, apesar disso, dez anos como Presidente da Comissão constituem um marco histórico, de que ele se deveria pessoalmente orgulhar. Depois disso, ou ocupava um cargo político de topo, nacional ou internacional, ou dedicava-se a escrever livros relatando a sua experiência, a dar aulas e a fazer conferências pelo mundo. Durão Barroso deitou tudo isso fora ao ir para o Goldman Sachs. Só se pode por isso queixar de si próprio, não podendo pretender que a Comissão Europeia lhe reconheça um estatuto que ele mesmo não quis para si, achando mais importante um lugar na Goldman Sachs. E aos que apoiam esta decisão de Durão Barroso, pergunto apenas se alguma vez viram um ex-Presidente dos Estados Unidos a aceitar um cargo semelhante.

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publicado por Luís Menezes Leitão às 19:24

Uma obra-prima.

Segunda-feira, 12.09.16

Clint Eastwood é o último dos realizadores clássicos americanos, herdeiro de um tempo em que no cinema se contava uma história simples e cativante, com heróis que ficavam para sempre na nossa memória. Hoje o mainstream do cinema americano são os blockbusters, que entretêm, mas se esquecem ao fim de um minuto depois de sair da sala. É por isso com grande satisfação que se vê um filme como Sully, em Portugal (mal) traduzido para Milagre no rio Hudson. É um facto que os portugueses não conseguiriam identificar a referência ao comandante Chesley Sullenberger que em 15 de Janeiro de 2009 salvou 155 passageiros ao fazer aterrar de emergência no rio Hudson um avião que tinha perdido os dois motores. Mas o filme não conta a história de milagre algum, mas antes de uma decisão humana, demasiado humana, tomada em segundos perante uma situação crítica. O título brasileiro O herói do rio Hudson é por isso mais apropriado.

 

Sully é efectivamente um herói, um piloto de avião que perde dois motores a baixa altitude e consegue perceber que a única possibilidade que tem de salvamento é o rio, enquanto que na torre de controlo lhe pedem insistentemente que dirija o avião sem motores para qualquer aeroporto nas proximidades. E que sabe que a decisão sobre o destino daquele avião é apenas sua, não perdendo tempo a dizer aos passageiros nada mais do que algo que ninguém quer ouvir dentro de um avião: "preparem-se para o impacto". E, depois do impacto, assume a posição do comandante, que não abandona o barco antes de os passageiros se salvarem, sendo o último a abandonar o avião.

 

Mas esse herói americano tem depois que lutar contra o sistema, composto de burocratas, de comissões de avaliação, e de seguradoras, que avaliam a sua decisão através de computadores ou pilotos num simulador, e que sustentam que um avião naquelas condições chegaria calmamente a qualquer aeroporto. O sistema não permite heróis, já que só tem espaço para autómatos obedientes. E nessa altura Sully, um homem simples, sofre profundamente, vendo que a sua carreira de 40 anos nada vale perante os 208 segundos da sua decisão crítica. Mas, tal como Dirty Harry enfrentava o sistema para fazer a sua justiça, Sully defende brilhantemente a sua decisão perante o painel de avaliadores. A certa altura perante as suas respostas, parece que estamos a ouvir Dirty Harry: "Go ahead, make my day!".

Uma palavra para Tom Hanks, talvez ele próprio também o último dos actores clássicos americanos, que faz um Sully extraordinário. Quase nos faz esquecer a imagem do verdadeiro Sully, que só voltamos a recordar quando o vemos surgir no filme em pessoa.

 

Recentemente Clint Eastwood deu polémica ao declarar o seu apoio a Donald Trump. Confesso que a polémica me espanta. Donald Trump é efectivamente um misógino e racista, que só um suicídio do Partido Republicano conseguiu transformar em candidato presidencial, mas sinceramente alguém estava à espera que Clint Eastwood fosse apoiar Hillary Clinton? Hillary Clinton representa o establishment político actual e Clint Eastwood já demonstrou que odeia profundamente o sistema. Dirty Harry, o veterano Walt Kowalski ou o sniper americano Chris Kile que o digam. E, perante os últimos avanços de Trump nas sondagens, Clint Eastwood até pode perguntar: "Do you feel lucky?".

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publicado por Luís Menezes Leitão às 07:51





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