O convite a Fernando Nobre.
Ao contrário de muitas opiniões já aqui expressas, acho uma péssima ideia o convite a Fernando Nobre para encabeçar a lista de deputados pelo círculo de Lisboa, no intuito já revelado de ser o futuro candidato a Presidente da Assembleia da República. A meu ver, esse convite é prejudicial tanto ao PSD como ao próprio Fernando Nobre. Vejamos por que razões.
Em primeiro lugar, não faz qualquer sentido um partido indicar aos eleitores que tem um candidato a Presidente do Parlamento. O Presidente do Parlamento é escolhido pelos deputados, dependendo da maioria existente no Parlamento. No caso de Fernando Nobre, a candidatura a Presidente do Parlamento aparecerá ao eleitorado como uma tentativa de alcançar o segundo cargo do Estado, depois de ter falhado o primeiro, sendo por isso visto mais como um projecto pessoal do que político. Tal só servirá para desbaratar o capital político acumulado nas presidenciais.
Em segundo lugar, o PSD em nada vai alargar o seu universo eleitoral com a candidatura de Fernando Nobre e até o poderá reduzir. Passos Coelho está a cair no mesmo erro de Manuela Ferreira Leite quando candidatou nas últimas eleições Maria José Nogueira Pinto a deputada pelo círculo de Lisboa, julgando que assim retirava votos ao CDS. Ora, o CDS teve nas últimas eleições uma votação esmagadora, ultrapassando pela primeira vez em muitos anos os dois dígitos. Na verdade, está demonstrado que em Portugal chamar candidatos de outras áreas políticas não compensa e até penaliza. Ora, o currículo de Fernando Nobre, com a sua proximidade ao Bloco de Esquerda, e depois o facto de ter sido candidato da linha soarista do PS contra Manuel Alegre tornam-no adequado para tudo menos para ser candidato pelo PSD. Há muitos eleitores do PSD que não se vão rever minimamente nesta candidatura.
Em terceiro lugar, Fernando Nobre defrontou há dois meses Cavaco Silva nas eleições presidenciais, tendo Cavaco Silva sido apoiado pelo PSD. Não se compreende por isso que o PSD agora o venha apresentar como candidato a deputado nas suas listas, depois de ter estado há pouco tempo contra a sua candidatura a Presidente. Com isto, transmite-se uma imagem de que não é o candidato Fernando Nobre que é desejado, mas antes os votos que ele obteve nas presidenciais. Ora, é manifesto que esses votos não são transferíveis para o PSD. Se alguém tinha dúvidas sobre isso leia os comentários que estão a ser feitos na página de Fernando Nobre no Facebook.
Há apenas um enquadramento em que a candidatura de Fernando Nobre faz todo o sentido. Perante a verdadeira catástrofe humanitária que vai ser a entrada do FMI em Portugal já na próxima terça-feira, é melhor de facto chamarmos desde já a AMI. Pode ser que Fernando Nobre, com a sua experiência em ajudar as pessoas atingidas por catástrofes, possa dar algum contributo neste quadro trágico em que Portugal caiu.
Autoria e outros dados (tags, etc)
O país a ir ao fundo, e se calhar sem o Fundo.
O que se tem passado nos últimos tempos em Portugal e na Europa, demonstra o acerto daquela frase clássica de Ovídio nas suas Lamentações (Tristia, Liv. I, 9, 5, 6): "Donec eris felix, multos numerabis amicos; tempora si fuerint nubila, solus eris" (enquanto fores afortunado terás muitos amigos; se os tempos ficarem nublados, ficarás só). Depois de termos comprometido a nossa soberania com o apelo ao FEEF e ao FMI, e aceite todas as humilhações dos órgãos comunitários, que nos últimos dias nem sequer pouparam o Chefe de Estado, temos agora a notícia de que se calhar nem sequer nos fornecem a ajuda financeira prometida. Ou seja, depois de na Europa terem dito vezes sem conta que a ajuda estava disponível, e que só era preciso Portugal pedi-la, surgem agora com um comportamento arrogante e que pode até passar pela rejeição da ajuda. Para isso muito podem contribuir as eleições na Finlândia, onde o Partido dos Verdadeiros Finlandeses (o nome é todo um programa!) tem feito campanha no sentido de ser rejeitada a ajuda a Portugal e que, se for Governo, não hesitará em vetar essa ajuda no Conselho Europeu. Aqui temos a demonstração de quão amigos são os nossos "parceiros europeus" e no verdadeiro disparate que foi a ajuda externa ter sido pedida por um Governo de gestão, cuja legitimidade está ferida de morte, estando os órgãos comunitários a exigir compromissos a partidos de um Parlamento já dissolvido e a quem falta ainda mais legitimidade para negociar o que quer que seja. É constrangedor o estado a que os nossos políticos deixaram chegar o país: o país está a ir ao fundo e se calhar até vai ficar sem o Fundo.