Brexit.
Desde há muito tempo que me parecia que a União Europeia caminhava para o desastre. Na verdade, nunca passou de uma construção de burocratas, feita completamente à margem dos eleitores. Quando alguém falava em referendar os avanços na construção europeia, diziam-lhe que a democracia representativa era suficiente. Quando um país rejeitava em referendo esses avanços, diziam-lhe que tinha que repetir o referendo até dar o resultado que Bruxelas queria. E o que Bruxelas queria era sempre uma espécie de União Soviética, com os povos amarrados a uma estrutura muito pouco democrática, cujas decisões tinham que aplicar cegamente. E se essas decisões de Bruxelas afrontassem a constituição do país, ele era até obrigado a mudar a sua constituição.
Tudo isto foi muito bonito, enquanto houve dinheiro a rodos para distribuir. Quando o dinheiro acabou, os países perceberam a armadilha em que tinham caído. Não têm moeda, não têm soberania, e nada podem decidir, tendo que aplicar cegamente as decisões europeias, por muito maus resultados que as mesmas dêem. E se esses resultados não chegarem, até podem ser sujeitos a sanções por terem feito o que lhes mandaram.
Havia, porém, um país que, devido à brilhante intervenção da Senhora Thatcher, soube sempre se colocar fora deste disparate. O Reino Unido conservou a libra, estabeleceu sempre uma série de opt-outs, e servia de claro contraponto à dominação alemã da Europa. Apesar disso, decidiu sair, confirmando a regra de que quando os povos são perguntados sobre se estão interessados em manter-se neste absurdo, a resposta é sempre um rotundo "não". No caso inglês a explicação é simples: o país não tem uma constituição escrita, e a sua estrutura assenta na soberania do parlamento britânico. Por isso nunca os eleitores britânicos aceitariam ter um parlamento subordinado à União Europeia. Outros países aceitam facilmente mudar as suas constituições em obediência a Bruxelas, o Reino Unido não.
Mas, se alguém pensa que isto vai ser um caso isolado, está bem enganado. Ao Reino Unido seguir-se-ão muitos outros países, onde vão aparecer posições políticas, propondo como alternativa à austeridade perpétua a saída da União Europeia. Um deles pode ser já a França, caso Marine Le Pen vença as eleições presidenciais. E aí a União Europeia terá o mesmo destino da União Soviética, com os países a sair um a um, até os burocratas perceberem que já nada mais têm para gerir.
Os defensores do Brexit estão eufóricos e dizem que este é o dia da independência britânica. Para mim é um dia triste, o do colapso da União Europeia. Mas também acho que a União Europeia só tem que se queixar de si própria. Esta construção é a de um gigante com pés de barro. Enquanto não existir uma democracia a sério na União Europeia, o seu colapso total é inevitável.