A crise política na Madeira.
Tenho visto aparecer afirmações sobre a resolução da crise política na Madeira praticamente decalcadas da péssima solução que Marcelo Rebelo de Sousa adoptou para o país, que se baseou em adiar, quer a demissão do Governo, quer a dissolução do Parlamento para permitir a aprovação do orçamento. Isto implicou que o país esteja a viver num limbo durante quatro meses, em que as instituições se vão degradando à vista de todos, sem que ninguém faça nada para resolver os problemas.
Na Madeira, no entanto, esta solução não é replicável por uma razão muito simples: É que nas Regiões Autónomas vigora um regime parlamentar puro, enquanto que na República o regime é semipresidencialista. Tal leva a que grande parte do que foi feito no país não possa ser repetido na Madeira.
Assim, em primeiro lugar, não há qualquer possibilidade de o Presidente do Governo Regional apresentar a demissão e a mesma não ser logo aceite, uma vez que o art. 62º, nº1, b) do Estatuto Político-Administrativo da Madeira refere expressamente que implica a demissão do Governo Regional a apresentação pelo Presidente do Governo Regional do pedido de exoneração. Ou seja, é logo no momento da apresentação do pedido de exoneração que se verifica a demissão do Governo Regional, não podendo a mesma ser adiada, pois não é necessário qualquer acto de aceitação.
Para além disso, ao contrário do que sucede na República, onde o Programa do Governo é discutido, mas não votado, só podendo o Governo cair se for apresentada uma moção de rejeição, na Madeira o Programa do Governo Regional implica a apresentação de uma moção de confiança (art. 59º, nº1, EPAM), pelo que sem a Assembleia Regional aprovar o seu Programa, o Governo Regional ficará em gestão (art. 63º, nº1, EPAM). Assim, qualquer substituto de Miguel Albuquerque terá que ter necessariamente desde o início a confiança da maioria da Assembleia Regional.
Em qualquer caso, como a Assembleia Regional ainda não fez seis meses sobre a sua eleição, a mesma não poderá ser dissolvida pelo Presidente da República a não ser daqui a dois meses. Não parece, porém, que possa ter seguimento a evidente tentativa do Presidente da República de manter o actual Governo Regional em plenitude de funções até esse momento. Basta que algumas das anunciadas moções de censura seja aprovada para que tal já não seja possível.
Aguardemos assim pelas cenas dos próximos capítulos.
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Dois coelhos com uma só cajadada.
Parece que os líderes da oposição andam a fazer concorrência a ver quem é que recua mais depressa perante os ultimatos de António Costa. O resultado da sua vergonhosa jogada política vai ser gabar-se de ter apanhado dois coelhos apenas com uma só cajadada.
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O desacordo de perdição nacional.

Sempre me pareceu que este desfecho era inevitável. É por isso óbvio que os partidos fizeram uma triste figura em aceitar a imposição do presidente para uma reunião tripartida, na qual acho que nem sequer ele acreditava. Na verdade, parece-me que tudo isto não passou de uma encenação para Cavaco demonstrar que não assinava de cruz a proposta de remodelação do Governo.
Como bem foi salientado por inúmeros militantes, o PS não podia aceitar agora dar a mão ao governo, a não ser que a sua direcção se quisesse suicidar. Ao contrário do que Soares afirmou, nunca esteve em causa uma cisão no PS, mas apenas a defenestração de Seguro, inevitável se este subscrevesse o acordo. A saída de inúmeros deputados depois da votação da moção de censura foi aliás um recado claro sobre o que se iria passar a seguir.
O PSD e o CDS também não podiam aceitar o presente envenenado que Cavaco queria dar a Seguro de marcar eleições no prazo de um ano. Efectivamente, nessas condições ninguém quereria ir para o Governo, nem o Governo teria coragem de fazer as reformas absolutamente necessárias e que já há muito deveriam ter sido feitas. Acresce que, se houvesse acordo, daqui a um ano seria provavelmente António Costa quem lideraria o PS, combatendo sem quartel os partidos da maioria a partir de Lisboa.
É por isso que um acordo entre os três maiores partidos seria sempre impossível, pelo menos nos termos que Cavaco queria. Os três partidos, no entanto, não quiseram ficar mal na fotografia e envolveram-se nestes últimos dias num verdadeiro jogo de sombras, simulando uma negociação que já se sabia que não iria dar em nada, apenas para tentar atirar para o outro as culpas do fracasso.
Custa-me ver, no entanto, o Presidente e os partidos a fazerem os eleitores de parvos. Nunca o Presidente deveria ter proposto semelhante aberração política e, se o tivesse efeito, os partidos deveriam tê-la liminarmente rejeitado. E não é por se chamar de salvação nacional que este compromisso mereceria a mínima credibilidade. A seguir ao 25 de Abril também se constituiu uma Junta de Salvação Nacional. A mesma foi logo substituída por um Conselho da Revolução que mergulhou o país no PREC.
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A coisa aqui está preta.

Os acontecimentos dos últimos tempos fazem-nos perguntar se é possível existir um país assim.
Primeiro o Presidente não aceita uma remodelação governamental e propõe eleições a prazo, mas ao mesmo tempo propõe qie cheguem a acordo três partidos que ultimamente não se têm entendido sobre coisa nenhuma.
Um partido que não existe, e só tem dois deputados, apresenta uma moção de censura no Parlamento. Quer a maioria quer a oposição aplaudem a iniciativa que consideram clarificadora. O maior partido da oposição acha normal estar simultaneamente a negociar com os partidos do Governo e a censurar o Governo. Já o Governo acha que a moção de censura do partido inexistente reforça a sua legitimidade.
Entretanto o Presidente mostra que tem outras prioridades. Afasta-se da confusão do continente e vai para as Selvagens agarrar calca-mares e anilhar cagarras. A não ser que a iniciativa seja um estágio para aprender a agarrar os partidos e anilhar os seus dirigentes, não se percebe a sua utilidade neste momento. Mas os Portugueses já se habituaram a considerar insondáveis os desígnios do Presidente.
Como cantava o Chico Buarque: "Uns dias chove, noutros dias bate o sol. Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui está preta". Alguém transmita esse recado ao Presidente.
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O fado do silêncio
Guilherme Silva disse uma coisa absolutamente óbvia: "Que o Governo não tem condições para continuar se houver ajuda externa". E de facto não deve haver uma única pessoa que ache normal manter em funções um Governo que tenha conduzido o país à bancarrota. Até o Governo irlandês se viu forçado a convocar eleições, depois de ter tido necessidade de recorrer à ajuda externa, apesar de a sua responsabilidade pelo sucedido ser muito reduzida.
Mas, mesmo fazendo declarações tão óbvias, Guilherme Silva foi mandado calar por Passos Coelho, o qual referiu que "se há pessoas do meu partido que insistem em cenários de crise política é porque estão a falar demais". De facto, como é possível haver militantes do PSD que não só pensam em cenários de crise política, como até se atrevem a falar deles? O Governo socialista está a governar maravilhosamente. O descalabro das contas públicas, a subida em flecha das taxas de juro, o caos nas eleições e o desmantelamento do sistema de justiça, tudo isso são pormenores técnicos que não devem preocupar um partido empenhado em fazer uma oposição responsável, ou seja muda. E se por acaso ocorrer a bancarrota nacional, é preciso continuar a apoiar este Governo, para evitar o perigo de termos que o substituir, o que pelos vistos ninguém deseja. Nada de falar em crises políticas, portanto.
Nem nos tempos do Governo do Bloco Central vi o PSD ser transformado num mero sustentáculo de um Governo PS, como está agora. O PSD não participa no Governo mas viabiliza praticamente todas as medidas que o mesmo propõe, por muito gravosas que sejam. E agora pelos vistos agora até deve calar qualquer ameaça de crise política, mesmo perante um facto tão óbvio, como a bancarrota nacional. Enquanto o país vai sendo conduzido para o precipício, resta ao PSD entoar o fado do silêncio.
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O medo da crise política.
O Governo de Sócrates sobrevive hoje exclusivamente à custa do medo que instituiu em todos os agente políticos de que o seu derrube represente uma catástrofe para o país. Em consequência toda a actividade política está condicionada por esse medo. O Presidente da República não se atreve a demitir o Governo, apesar de as situações em que este se envolveu porem claramente em causa o regular funcionamento das instituições. O PSD acaba de pactuar com o Governo uma série de medidas gravíssimas de aumento de impostos para além do limite do suportável, "desculpando-se" com o medo de que se agrave a crise financeira, que nos cortem o crédito, e possa cá chegar o papão do FMI. Mas, em consequência desse medo, o Governo continua na sua senda despesista e depois de se recusar a abandonar a linha do TGV para o Poceirão, vai ainda lançar novo concurso para a terceira travessia do Tejo. Pelo caminho, Sócrates permite-se gozar com o aumento do IVA nos bens essenciais, dizendo que também abrange as Coca-Colas, demonstrando assim uma enorme insensbilidade social, ao fazer os pobres pagar a crise.
Estamos assim num ciclo vicioso, que não há maneira de ser quebrado. Enquanto os agentes políticos tiverem medo de derrubar o Governo, o Governo vai continuar a conduzir esta campanha alegre, e a situação do país continuará a agravar-se cada vez mais.
Que não haja ilusões quanto à urgência em se alterar esta situação. Há um claro paralelo entre a crise que atravessamos e a América depois da crise de 1929. Roosevelt concorreu e venceu Herbert Hoover em Novembro de 1932, com um ambicioso programa de reformas económicas. No entanto, só podia legalmente tomar posse em Abril do ano seguinte. Ora, esse período de mais seis meses traduziu-se no arrastar da crise, com a falência de um banco por dia. Tomando consciência dessa situação, logo que assumiu o cargo, mandou alterar a lei, antecipando a tomada de posse do novo Presidente para Janeiro, como ainda hoje ocorre.
Simbolicamente, a chegada de Roosevelt ao poder foi marcada por um discurso contra o medo que atingia a América, de que ficou a frase emblemática: "We have nothing to fear but fear itself". É tempo de em Portugal se tomar consciência de que não se pode deixar arrastar por mais tempo esta situação. Se este Governo durar mais seis meses, esses seis meses serão catastróficos para Portugal. Deve-se terminar rapidamente com este Governo e colocar no poder um novo Governo, que devolva a confiança aos cidadãos, e tenha a coragem de realizar as reformas que se impõem.